Artistas participantes da exposição Enciclopédia Negra, em cartaz na Pinacoteca do Estado de São Paulo, abrem as portas de seus ateliês e falam sobre suas rotinas, inspirações e perspectivas.
Panmela Castro
Alteridade e pertencimento norteiam tanto a arte quanto o espaço onde Panmela Castro vive e produz desde 2016: uma casa de morro que “não é chique, mas, sim, afetiva”, no Catete, Rio de Janeiro. Aos 40 anos, conta que sempre se sentiu ocupando um não lugar. “Nem branca, nem negra retinta, nem gorda, nem magra, da academia e da rua.” A solução? Abrir seu processo criativo autobiográfico.
“Quando o outro se identifica com as minhas experiências, o ciclo se completa e eu pertenço a algum lugar”, revela. A magia acontece no seu lar, em particular na varanda, destinada à pintura. Aqui, durante a pandemia, ela desenvolveu a série Vigília, ainda em curso. Resultado de noitadas com namorados ou amigos próximos, as pinturas registram essa verdadeira performance. “Ninguém sabe o que acontece ali! Eu preparo um jantar, bebidas, acendo as luzinhas e a varanda vira uma discoteca. Tem gente que fica até o amanhecer. A vista para o Pão de Açúcar e o mar é de tirar o fôlego.” Antes disso, nos primeiros meses de isolamento, Panmela elaborou as pinturas para a Enciclopédia Negra. “Daquela vez, o desafio foi experimentar a partir da imaginação. Fiquei preocupada com o contexto histórico, pesquisei referências, fui fazendo e refazendo.” Tanto que, para chegar às cinco obras comissionadas, realizou 18. Muitas se encontram na galeria paulistana Luisa Strina, que passou a representá-la no início do ano e atualmente mostra seu trabalho na coletiva O Canto do Bode, uma parceria
com as galerias Fortes D’Aloia & Gabriel e Sé na Casa da Cultura da Comporta, em Portugal. Conhecida pelos retratos, Panmela ganhou fama com performances e grafites, aludindo a nomes como Sophie Calle, Tracey Emin e Louise Bourgeois. O ativismo de sua arte é complementado pela ação na Rede Nami, organização
liderada por ela em prol dos direitos da mulher, localizada na mesma rua do antigo sobrado com pastilhas brancas e azuis na fachada: “É aqui que me sinto livre, em casa.”