Pueblo Fantasma: Magdalena Jitrik
Past exhibition
Apresentação
Para Magdalena Jitrik, a vivência do tempo histórico e a criação assumem forma de um modo análogo àquele que se dá entre a vigília e a vida onírica. Não se trata aqui de uma relação entre reflexos esquemáticos, nem de restos diurnos, mas de continuidades e infiltrações mútuas, por meio da emergência de símbolos que possuem uma inesgotável carga polivalente. Existe, para Magdalena, um espaço de transição entre ambas as esferas que se condensam no nome da exposição. A partir do encontro com a palavra certa começa o andar de um mundo. Estamos em um Pueblo fantasma [Povo fantasma].
Na imagem mental que Pueblo fantasma evoca existe um eco de faroeste – quando o mato seco rola pela rua principal, vazia e empoeirada – ou de um romance gótico – um vilarejo gélido habitado por espectros. Talvez não seja um lugar tão distante das paisagens dos pampas impregnadas na retina de Magdalena durante uma viagem recente. Essa planície, que parece guardar um precipício adiante, desprega-se como um manto verde radioativo pigmentado com glifosato. O deserto se move entre a visão de colheitadeiras e de outdoors publicitários ao longo da estrada. Próximas dali, estão as vias férreas que durante a segunda metade do século XX deram forma a uma complexa estrutura conectando toda a nação, um sistema destruído durante o ciclo privatizante – desindustrializante – dos anos 1990. Esse horizonte crepuscular é evocado com ares de parque de diversão em Ferrocarriles Argentinos [Ferrovias argentinas], uma obra composta por um sistema de trem elétrico que percorre um caminho sinuoso entre pinturas içadas como bandeiras ou estandartes.
A noção de rede marca a obra de Jitrik de modos diversos, por exemplo, na criação de formas geométricas interconectadas e em jogos de palavras, como o que ocorre no próprio uso da palavra “red” (cujo significado, em espanhol, é rede, mas que também significa vermelho, em inglês), e nas suas abordagens de episódios históricos, que assumem, inclusive, a forma de um atlas. A diversidade conceitual do termo “red” pode ser vista na pintura-estandarte Red Cloud Army [Exército de nuvens vermelhas], um monumental retrato dedicado a treze caciques da Grande Nação Sioux; em Orquesta Roja [Orquestra vermelha], seu projeto musical, que, por sua vez, é também o nome de uma pintura; na exposição Red de espionaje [Rede de espionagem]; ou em suas imagens recentes compostas de estruturas conectadas por linhas e pontos em Pueblo Fantasma.
Ainda nesta exposição, a noção de rede funciona em Ferrocarriles Argentinos como um sistema de comunicação localizado em um território imaginário. O uso poético de um elemento industrial, nascido em uma fábrica e incorporado a sua obra, constitui um procedimento inédito. Se as instalações anteriores de Jitrik se caracterizavam pelo desenvolvimento de técnicas tradicionais ancestrais, arquiteturas de adobe ou de pedra ligadas a culturas americanas, agora, a artista faz uso de uma matéria fabricada, processada, com um funcionamento mecânico. O traço presente em todos esses procedimentos é o fascínio pela capacidade humana de transformar a matéria por meio do uso da força de trabalho.
Se, com a marcha do trem, Jitrik introduz, de maneira prismática, sua meditação sobre os processos da modernidade, especificamente aqueles ligados à noção de progresso, também outras máquinas se fazem presentes nas pinturas. Surgem redes e engrenagens caracterizadas por sutis ressonâncias duchampianas: Machines célibataires [Máquinas celibatárias] disparam raios de cor e se enlaçam entre pontos, fitas magnéticas giram em paisagens pitagóricas. Elipses, dínamos, átomos se movem, produzindo uma espécie de energia desconhecida. Há um olho – que aparece pela primeira vez nos esboços que a artista produziu durante a pandemia, derramando lágrimas pretas – refletindo ou refratando a luz. O mundo que as pinturas de Magdalena Jitrik produzem não é o mundo do quantificável Cronos, mas sim outro, geralmente oculto, elástico e silencioso.
— Florencia Qualina
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