Thiago Honório
b. 1979, Carmo do Paranaíba, Brazil
Lives and works in São Paulo, Brazil
Pauliceia, 2018-2024
fac-símile do livro "Pauliceia Desvairada" (1922), de Mário de Andrade; concreto, videoperformance de ação realizada na cidade de São Paulo
[facsimile of the book "Pauliceia Desvairada" (1922), by Mário de Andrade, concrete, videoperformance of an action that took place on the sidewalk of the city of São Paulo]
[facsimile of the book "Pauliceia Desvairada" (1922), by Mário de Andrade, concrete, videoperformance of an action that took place on the sidewalk of the city of São Paulo]
34 x 25.2 x 3.5 cm - incrustrado [inlaid]
13 3/8 x 9 7/8 x 1 3/8 in
13 3/8 x 9 7/8 x 1 3/8 in
21243
© artista [the artist]
Paulicéia é um trabalho híbrido formado por uma escultura de concreto construída com uma edição fac-símile do livro “Paulicea Desvairada”, de 1922, de Mário de Andrade (1893-1945) recortada; uma ação escultórica e performática realizada na Avenida São João no centro de São Paulo; um conjunto de fotografias e um vídeo que registra tal ação.
O trabalho problematiza algumas noções como a de malha urbana e aquilo que mobiliza os interesses – políticos, econômicos, culturais – da vida social numa grande cidade. Apresenta, em sua evidência física, uma operação recorrente em minha produção: superfícies transplantadas a partir de procedimentos como deslocamentos, cortes e montagens.
A obra toma como matéria o primeiro livro de poesia modernista brasileiro “Paulicea Desvairada”, escrito por Mário
de Andrade entre 1920 e 1921, e publicado em 1992. Este livro foi escrito num cenário de mudanças de uma metrópole que encontrava-se em vias de modernização e urbanização, período que revela o processo de expansão demográfica na cidade. O
livro é marcado por passeios do poeta pelas ruas da “Paulicea” desvairada – desvairada, nesse caso, quer dizer, desvario –, uma São Paulo que se desenvolvia a partir das contingências, das necessidades e do acaso, e que era apresentada pelo poeta como um palco. “As injustiças e os sofrimentos denunciados pelo poeta no seu passeio pela Paulicea” são revelados nos poemas a partir de uma crítica mordaz, em passagens ácidas e debochadas como em “Ode ao Burguês”. Há, em “Paulicea Desvairada”, um olhar crítico em relação às contradições e os contrastes complexos presentes no processo de modernização de uma das maiores cidades do mundo, descortinando de maneira burlesca, ao longo dos 22 poemas, problemas sociais.
“Da adversidade, vivemos”, como encontrar o poético no risco e na violência? Como vestir de poesia uma megalópole violenta, áspera e repelente? O que é uma cidade repleta de contrastes e contradições sociais travestida de poesia? Como vestir a cidade de poesia? Como pensar na ideia de um revestimento poético a partir de superfícies significantes nesse campo minado em estado de alerta?
Um losango presente na capa do fac-símile do livro “Paulicea Desvairada” foi recortado e extraído. Esse losango refere-se ao tipo de padronagem presente na roupa do arlequim, que reconstitui uma espécie de arquétipo da personagem bobo-da- corte conhecido pelas ácidas e críticas sátiras sociais que fazia. Tal losango, ainda, presente tanto na capa do livro como na malha ou veste do arlequim, também pode ser associado à ideia de mosaico, malha ou revestimento que recobre os calçamentos de grandes centros urbanos. O losango extraído será incrustrado na malha urbana em uma das ruas da cidade de São Paulo citadas no texto, a icônica Avenida São João. Um registro em vídeo e um ensaio fotográfico serão realizados registrando essa ação.
Em Pauliceia foi construída uma escultura de concreto – material presente no vocabulário da cidade – na qual o livro recor- tado foi introduzido. O trabalho acontece lá e cá, cá e lá, no espaço de exposição e no “corpo” da cidade, ao trazer um pedaço físico do livro para a malha urbana e ao afixar o livro num fragmento do mosaico da cidade.
Thiago Honório, julho de 2019.