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Obras
Panmela Castro N. 1981, Rio de Janeiro, Brasil
Vive e trabalha em Rio de Janeiro e São Paulo, BrasilMulheres Negras Não Recebem Flores (Andrea Manneli), 2021óleo sobre tela
[oil on canvas]60 x 60 x 4 cm
23 5/8 x 23 5/8 x 1 5/8 in18945© artista [the artist]Trabalhando a partir de suas experiências pessoais acerca do tema da “solidão da mulher negra” desenvolvido pela pesquisadora negra da Universidade Federal da Bahia Ana Cláudia Lemos Pacheco, Pamela Castro inicia a produção de uma série de naturezas mortas de flores. A teoria parte do princípio de que mulheres negras não são entendidas como seres dignos de afeto, e por estarem longe dos padrões de beleza, são preteridas pelas brancas, as lançando em um tipo de celibato compulsório e na dificuldade de se manter em relacionamentos afetivos, oficiais de longo prazo. Um problema do racismo estrutural. Daí vem a frase “meninas negras não recebem flores”. Ao visitar a casa das pessoas retratadas em suas pinturas, nota que flores naturais são compradas para decorar o ambiente, em um tipo de delírio autorreferente, cria a percepção de estar sendo presenteadas com ela, desenvolvendo uma sensação de pertencimento, ponto recorrente em sua obra. Entre realidade e ficção, algumas vezes, passa a realmente receber flores com cartões de saudação e, ainda outras, pinta até mesmo flores artificiais em sua busca de aceitação e amor. ‘Alguns anos atrás, a frase de Gabriela Moura se tornou viral e deu o nome à minha série de flores: “Mulheres negras não recebem flores”. Neste conjunto, coleciono pinturas-memórias de flores que ganho, roubo, ou que encontro nas casas que visita, em uma busca incessante por afeto.” Veja o texto de Gabriela Moura: https://medium.com/gabriela-moura/meninas-pretas-não-ganham-flores-bd6632f55da6 De tempos em tempos analiso meus pensamentos e tento distinguir o que é problema social ou mera experiência pessoal. São muitos os exemplos que mostram que o racismo não é uma experiência vivida só por mim, mas também por várias das minhas manas. Essa é uma questão histórica. Penso a partir de Lélia Gonzalez e seu conceito de ‘Amefricanidade’, e ainda posso dizer que sou uma brasileira miscigenada, descendente de pessoas negras trazidas da África, de indígenas donos das terras Pindorama e de um pouco de gente branca que aqui se instalou. Assim sendo, como a maioria das mulheres que compartilham dessas vivências, tenho minha ancestralidade apagada pelo colonialismo, sem saber quem são meus antepassados. Na busca contínua de compreender onde me localizo no mundo, me via muitas vezes sozinha, sem saber onde me apoiar ou a quem recorrer. Minha experiência no mundo, enquanto uma mulher que não se enquadra no padrão da branquitude, foi marcada pela solidão e pelo medo da rejeição, não somente em contextos estruturais, mas também nas relações interpessoais. Ana Claudia Lemos Pacheco já contextualizava esses sentimentos em sua tese sobre a solidão da mulher negra, que tem um conceito complexo e de muitas camadas, mas que resumo aqui como a ideia de que mulheres negras, pelo racismo e por estarem distantes do ideal de beleza (branco europeu), são preteridas por mulheres brancas e muitas vezes separadas entre o trabalho e o sexo. Por fim, com a dificuldade de estabelecer relações afetivas de longo prazo, acabam por liderar suas famílias sozinhas, sem um companheiro para dividir o sustento. A rejeição e a dificuldade em lidar com a afetividade são sintomas que compõem a história da grande maioria das ‘mulheridades’ negras brasileiras. De tanta carência histórica, o processo de pintar flores traduz minha busca incansável por afeto. Essa pesquisa fala sobre o que significa pertencimento para mim e para aquelas que, como eu, sentem a urgência de romper com os pactos coloniais. Assim surge a série antirracista “Mulheres Negras Não Recebem Flores”, criada por mim a partir de um texto da escritora Gabriela Moura que viralizou em 2019 na internet. Durante a pandemia, me isolei com alguns amigos em suas casas e fiquei encantada com os arranjos de flores que as enfeitavam. A partir desse olhar, revisitei a memória e me lembrei de quando passei a vida inteira acreditando que eu não era digna de receber flores, de viver esse tipo de afeto. Comecei então a fantasiar que essas flores, que já estavam em suas casas, eram na verdade para mim, por ocasião da minha visita. Passei a colecionar pinturas-memórias dessas flores, criando telas e nomeando-as com o nome das pessoas que me "presenteavam", cada uma única, com sua história e afeto, numa linha tênue entre ficção e realidade. Num tipo de delírio autorreferente, comecei a ver significado especial em flores que sequer eram para mim, até que me peguei pintando mesmo as de plástico. Com o tempo, comecei a receber muitas flores, das mais diversas cores e tamanhos. Fui agraciada pelos presentes desses amigos que, num simples gesto de me enviar um buquê, conseguiram transformar o medo que eu sentia pela rejeição, criando em mim uma memória em que não cabe mais a solidão, mas sim a riqueza do afeto. São os meus amigos que me lembram que eu não só sou digna de receber flores, mas também de ser amada. [Panmela Castro]Exposições
Ostentar é estar viva, exposição individual com curadoria de Daniela Labra na Galeria Luisa Strina, 2021-2022
[To Flaunt is to be alive, solo show curated by Daniela Labra at Galeria Luisa Strina, 2021-2022]1de 4